Agronegócios
Crise na Venezuela pode abrir espaço a frango brasileiro
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Em meio à articulação liderada pelos EUA – e apoiada pelo Brasil – para derrubar Nicolás Maduro da presidência da Venezuela, os frigoríficos brasileiros vão propor ao Ministério das Relações Exteriores a criação de uma linha de financiamento à exportação garantida pelo petróleo venezuelano. A medida entraria em vigor caso a crise política do país termine com a vitória das forças oposicionistas.
O objetivo dos frigoríficos é unir um tema sensível – o abastecimento de alimentos para combater a fome na Venezuela – à necessidade de ampliar as exportações de carne de frango do Brasil, que vêm sofrendo nos últimos anos com restrições comerciais.
A proposta, preparada pela Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), será entregue nesta semana pelo presidente da entidade, o ex-ministro da Agricultura Francisco Turra, ao Itamaraty. O ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, também receberão o proposta formulada pela ABPA.
“A primeira coisa que a Venezuela vai precisar é de alimentos, e ninguém tem garantia melhor de fornecimento do que o Brasil, que tem larga tradição”, afirmou Turra ao Valor. O frango é o principal produto da proposta, mas a ABPA também quer exportar carne suína e ovos ao país.
No passado recente, a Venezuela foi um destino relevante para a indústria de carne de frango do Brasil. O auge foi em 2014, quando os embarques renderam quase US$ 430 milhões, 5% das exportações do setor, conforme dados da Secretaria de Comércio Exterior (Secex) compilados pela ABPA. Entre 2009 e 2015, os frigoríficos enviaram pelo menos 99 mil toneladas anuais de carne de frango aos venezuelanos, angariando mais de US$ 200 milhões por ano.
Com o recrudescimento da crise econômica na Venezuela, as exportações minguaram. Em 2018, apenas 114 toneladas foram vendidas. De acordo com Turra, a insegurança quanto à capacidade financeira dos importadores para honrar os compromissos pesou.
Agora, a avaliação de Turra é que a participação do Brasil nos esforços para tirar Maduro do poder – o país reconheceu Juan Guaidó como presidente interino da Venezuela – facilita a construção de um instrumento que dê segurança aos exportadores brasileiros, evitando o risco de calote. No passado, durante o governo Hugo Chávez, o setor tentou formular um instrumento parecido – com o petróleo como garantia – mas não teve sucesso. “Eles acharam uma humilhação”, disse Turra. Agora, no entanto, a relação amistosa do governo Jair Bolsonaro com a oposição venezuelana pode ser um trunfo para o Brasil, disse.
O presidente da ABPA sustenta que a linha de financiamento à exportação proposta é viável economicamente ao governo brasileiro, e não apenas politicamente. De acordo com o dirigente, o petróleo é uma garantia suficiente para dar segurança ao Tesouro Nacional, que teria de arcar com os custos de um eventual calote.
Turra avalia que a situação da Venezuela é melhor que a de Cuba. Os frigoríficos brasileiros contavam com uma linha do programa de financiamento à exportação (Proex) para a ilha mesmo sem garantias tão sólidas quanto o petróleo venezuelano, argumentou o presidente da ABPA. O caso de Cuba, porém, se tornou uma dor de cabeça aos frigoríficos. Por causa das relações diplomáticas mais conturbadas com Cuba no governo Michel Temer, os frigoríficos brasileiros não receberam. “Temos para receber US$ 28 milhões desde abril do ano passado”, disse Turra.
Apesar dos riscos, a ABPA avalia que a retomada das vendas à Venezuela contribuirá com a ambiciosa meta da entidade de exportar 500 mil toneladas por mês – somando carne de frango e carne suína. Em 2018, os embarques mensais atingiram, em média, 392,3 mil toneladas.